Grotte di Castro, apresentação

Para falar do menino grottano Giuseppe Confaloni, a gente fica meio sem saber por onde começar. Terminados seus estudos de Filosofia e Teologia, no Convento Dominicano de Fiesole, por permissão especial a ele concedida pelo Papa Pio XII, Eugênio Pacelli, devido à sua pouca idade, Giuseppe se tornou o frei Nazareno Confaloni.

Ele tinha então apenas 22 anos, quando celebrou sua primeira missa, aqui na Igreja Paroquial de São Pedro Apóstolo, no primeiro domingo de outubro de 1939. 11 anos depois, em 1950, ele foi para o meu país, o Brasil, a convite do Arcebispo Dom Cândido Penso, que o conheceu em Roma.

E é aí que sua história se bifurca, pois Nazareno Confaloni não foi apenas um frade dominicano, com sua paróquia, sua extensa Prelazia e seu enorme rebanho para cuidar.
Sem prejuízo de suas importantes funções religiosas, que não foram poucas, frei Confaloni foi fundador da primeira academia de arte do Planalto Central do Brasil, a Escola Goiana de Belas Artes (EGBA).
Foi também professor mestre de arte universitário e (não só!) foi o próprio fundador da Faculdade de Arte e Arquitetura (vinda da EGBA), possibilitando assim a criação da Universidade Católica de Goiás, hoje a Pontifícia Universidade Católica de Goiás. E ele foi um construtor de templos (construiu duas igrejas em Goiás).
Disse a vocês que ele foi um homem plural, pois são muitos os frei Confaloni. No entanto, como seu biógrafo (-e aqui em Grotte di Castro eu estive pela primeira vez em 1986, recebido pelo casal Rita Confaloni e Ideale Orsini, irmã e cunhado de frei Confaloni), posso afirmar que, de todas as atividades de frei Confaloni, é a sua atividade de artista que mais o completava, pois a arte não tem limites de linguagem para seu entendimento. E, com a arte, mais que com as palavras, pode-se chegar direto ao coração dos seres humanos.
Na Igreja Paroquial de São Pedro Apóstolo, aqui em Grotte di Castro, ele tem dois grandes painéis, um deles medindo 5,30x4m, fixado ao centro, no teto, retratando “A partida dos Apóstolos aos 4 cantos do Mundo”, do qual ele fora um deles, levando não só a palavra de Deus, mas também a arte que aprendera ainda jovem com a sua professora de desenho, de nome Briccola, e posteriormente na Academia de Belas Artes de Florença, no Instituto Beato Angélico de Pintura, em Milão, e na Escola Al’MIchelângelo”, em Roma.
(Em tempo: o outro painel na mesma igreja retrata Jesus Cristo Crucificado, que ele fez, em 1943, sob a ocupação “tedesca”, quando toda esta região estava dominada pelos alemães, na 2ª Grande Guerra).
No Brasil, ele afresca um por um os 15 Mistérios na Igreja do Rosário, na cidade de Goiás, um dos maiores conjuntos de afrescos de que se tem notícia, contando com 3 outros na Capela do Convento Dominicano.
Depois, no Estado de São Paulo, Araraquara, ele faria a decoração de toda Igreja da Fonte, também na técnica do afresco, contando a História da Salvação (veja o livro que trouxe aqui).
E na Estação Ferroviária da capital do estado de Goiás, hoje Museu Frei Confaloni, ele fez dois grandes afrescos (4x8m): Os Bandeirantes, antigos e modernos.
Ele fez na Usina de Cachoeira Dourada um surpreendente afresco de 7x15m, celebrando o momento de folga dos funcionários da Usina, em que eles estão nadando na água que gera a energia para dezenas de cidades e centenas de milhares de pessoas, incluindo Goiânia e Brasília, capital do Brasil.

Pela arte, frei Confaloni se tornou uma presença constante entre nós, no passado, agora no presente e a caminho do futuro. Bastaram-lhe 60 anos de vida para garantir sua eternidade.

 

Estamos em processo de realização do seu Raisonné (que é quando se procura documentar toda a obra de um artista). Já chegamos a mais de 1.500 registros fotográficos de obras suas (no Brasil e na Itália, onde já visitamos 16 famílias).

Seus amigos mais próximos e colegas de profissão artística calculam que ele tenha pintado mais de 8mil obras. Pois ele era um criador compulsivo. Quando não estava a trabalho sacerdotal ou de professorado, ele estava pintando ou desenhando.

Ele não parava. Parecia saber que a vida lhe seria curta. Além do cigarro, seu único vício (afinal ele era humano!), sabe-se hoje que a principal causa de sua morte teria sido a intoxicação com o chumbo presente nas tintas que utilizava, pois seu ateliê ficava ao lado de seu quarto de dormir, quase que fazendo um só cômodo, e as tintas ficavam abertas e espalhadas em sua paleta, a espera da próxima pincelada que não tinha hora para começar ou acabar.

Quando ele morreu, Goiânia tinha cerca de 400 mil habitantes, e a cidade inteira parou. Sua morte foi noticiada nacionalmente. O prefeito da cidade e o governador do Estado abriram uma especial exceção, a pedido de seus amigos e fiéis, e permitiram que seu corpo fosse enterrado fora do cemitério, na Capela que fica embaixo da igreja São Judas Tadeu, aquela mesma que ele idealizou, projetou e construiu.

Não que fosse rico, muito pelo contrário. Ele construiu essa igreja de estilo modernista, então a maior da cidade, vendendo seus quadros em rifas ou os entregando em contrapartidas a doações de materiais para a construção, desde a areia e o cimento, até os bancos da igreja. É lá que ele está sepultado há 47 anos, em uma Capela sob o altar.

A praça onde fica esta igreja mais tarde passou a ter o seu nome. Outras homenagens vieram.
Até o momento, 21 livros foram publicados com apresentação e estudos de sua vida e sua obra (os quais eu trago aqui, para ficar no espaço de arte dedicado a ele, criado pela Prefeitura de Grotte di Castro).
Frei Confaloni virou também nome de rua na cidade de Goiânia, nome de escola pública, nome de edifício residencial, nome de hospital e maternidade, nome de galeria de arte, nome de prêmio, de centro comunitário, calendário e selo postal.

Mais recentemente, passou a ser nome de dois museus, que surgiram com a finalidade de perpetuar os cuidados com seu legado artístico: um na cidade onde morreu, o Museu Frei Confaloni, criado e gerido pela Prefeitura de Goiânia; e outro na cidade onde ele chegou ao Brasil, o Museu Histórico Dominicano Frei Nazareno Confaloni, na cidade de Goiás.

Aqui, na cidade onde ele nasceu, ficamos sabendo que ele se tornou nome de Parque Público e, agora, passa a ser nome de uma Galeria Permanente, instalada pela sua Prefeitura, que manterá suas obras ao alcance de visitantes, crianças e jovens que se orgulham de seu exemplo, se orgulham de sua arte e de ver um cidadão desta cidade, pequeninho, de apenas 1.60cm de altura, transformado em um gigante que entrou para história por meio de seu trabalho, sua inteligência, seu dinamismo, sua dedicação, sua capacidade e sua vontade de realizações.

Antes que termine minha fala, é preciso destacar Rita Confaloni, irmã mais nova de frei. Foi ela que, com sua paciência e devoção, juntamente com seu marido Ideale Orsini, guardou tudo o que se relacionava a seu irmão querido e artista missionário que foi morar além mar.

Graças à Rita, ao conhece-la no ano de 1986, aqui em Grotte di Castro, eu pude aprofundar as pesquisas que resultaram em um primeiro livro biográfico sobre o frei seu irmão, premiado e publicado no Brasil pela Pontifícia Universidade Católica e recentemente traduzido para o italiano, por iniciativa de Rossella Orsini e Aldo Quadrani.

Estes dois, Rossella Orsini e Aldo Quadrani, têm honrado a vontade de Rita e a memória do frei, realizando um trabalho criterioso para a proteção e divulgação do seu legado artístico e de sua vida tão produtiva, prolífica e frutífera.

Agradeço a eles pelo apoio que nos tem dado no Brasil. E agradeço, penhoradamente, à Prefeitura de Grotte di Castro, em toda sua brilhante equipe, no nome do prefeito Antonio Domenico Rizzello, que tão bem percebe as riquezas que esta cidade tem, que merecem a atenção mundial.

Frei Nazareno Confaloni está ombreado aos melhores artistas de meu país. Lá -e aqui na Itália, ele deixou um legado que permanecerá na história, com seu exemplo reluzindo cada vez mais como uma referência do que o ser humano pode ser, do que pode sonhar -e do que é capaz de alcançar.

Mais obras de frei Confaloni podem ser vistas em seu site na internet, onde estão disponibilizados os resultados parciais do Raisonné Confaloni, uma pesquisa de registro de suas pinturas, desenhos, gravuras, aquarelas, painéis e murais em afresco, iniciada em 2013 e que já conta com mais de 1.500 obras registradas:    

              www.confaloni.org.br

(Esta pesquisa Raisonné vai virar um livro de 4 volumes, reunindo toda a produção de frei Confaloni que pudermos catalogar. Ela está ainda em processo, e qualquer nova obra é muito bem-vinda).

Salve Frei Confaloni, que seguiu em vida a Via Pulchritudinis, que por meio do belo nos leva a Deus. Desça sua luz sobre nós! Nos encante e nos ilumine, Confal(one)!

José Peixoto da Silveira Jr (Px Silveira), em Grotte di Castro, aos 07 de setembro de 2024

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *